Luminosidades...

(Falei hoje contigo). E de repente há um Sol que irrompe pelas frestas deste dia cinzento e pachorrento. A tonalidade da luz é única. Não há outra assim. (Como tu).

O meu Cinema Paraíso

Ontem inaugurei em casa o meu ciclo de cinema paraíso com o “Dr. Jivago”. A primeira vez que o vi tinha 16 anos. Fiquei esmagado com a beleza da fotografia. Embevecido pela história de amor. Encantado pela música de Maurice Jarre – creio ter sido a primeira vez que retive o nome do autor de música e o nome do realizador. Até aí só fixava os nomes dos artistas principais. E, claro, claro, fascinado pela Julie Christie. Um azul de olhos que jamais vira (azul assim só o da baía Azul). Poucos anos mais tarde, uma colega na faculdade em Luanda, linda, linda, havia-me de fazer lembrar muitas vezes a Julie… e nem sequer azul tinha nos olhos.

A segunda vez, anos mais tarde, já iniciado nas minhas andanças de cavaleiro marxista, recusei vê-lo. Era uma patética história de amor (pequeno-burguêsa, claro) e contra-revolucionária!

Ontem foi a terceira. A fotografia continua a esmagar-me. A história de amor é uma história de amor. Falta-lhe, pareceu-me agora, paixão, sensualidade. A música é indissociável do filme. Não podia ser outra. A Christie continua linda, linda. Fez-me lembrar a minha colega da faculdade… (revia-a há pouco tempo, continua linda!)

A leitura política que faço da película é que sofreu uma… reviravolta! E era aqui que queria chegar. Perturbou-me o filme. Perturbou-me ver como que um idealista – Pasha Strelnikoff – se transforma, em nome da revolução (sempre em nome da revolução…) num tenebroso sanguinário. Incomodou-me o filme. Incomodou-me sentir que eu, em circunstâncias idênticas, fizera, (salvaguardas as diferenças de protagonismo, claro!) o mesmo e cretino papel – o de guarda da revolução. Ainda que este se tivesse apenas quedado pelo plano ideológico. Mas a verdade é que defendera os mesmos princípios: o partido acima de tudo – família, amigos, afectos. O partido acima das pessoas. Em nome do povo. Sempre em nome do povo. Em nome das massas populares! (era assim que dizíamos). Interpelou-me o filme. Profundamente: se em 75 a revolução leninista tivesse triunfado (não esteve longe disso), até quando é que desempenharia aquele papel? Até quando? Mais. E, talvez, mais angustiante: qual era a linha que eu jamais ultrapassaria? Assustou-me perceber que quando (e enquanto) se acredita na revolução e no partido essa linha de demarcação é muito ténue. O partido toma conta do coração e apodera-se da razão. O partido passa a ser a razão de sermos. E a razão passa a ser a do partido. E é aqui, neste ponto, que se é capaz das maiores crueldades. Basta que a revolução o exija. Basta que o partido ordene.

Incomodou-me. Mas fez-me bem ver o filme. Recomendo-o aos meus amigos (e cavaleiros que foram comigo) das andanças marxistas.

Marcas indeléveis (do Império)... 4



Clube Desportivo Ferrovia - cidade do Cubal


Repare-se nas linhas arquitéctónicas. A foto é da época (1962?), mas a modernidade do edifício é actual. Actualíssima. Era aconselhável que o "ippar" de Angola iniciasse a inventariação e preservação do património respeitante ao período colonial. Estamos a falar do património de Angola. Nossas são apenas as marcas indeléveis.

Segunda-feira...

Hoje apetece-me fazer tudo. Tudo menos aquilo que tenho para fazer – que é tudo.

Marcas indeléveis (do Império)... 3


Palácio do Governador em Benguela

Amigos que vêm de longe!

O Sombreiro, visto do lado da Caotinha

Dentro de dias, muitos poucos, se tudo correr bem até lá (que o mesmo é dizer se Deus quizer), irei somar mais um aniversário. Já são muitos. São muitos se pensar que as ondas dos meus cabelos já lá vão e, pior, grande parte dos cabelos também... Mas são poucos se pensar que gosto muito de estar. Especialmente quando estou com os meus amigos – o que acontece raramente – com os meus amigos de sempre. Aqueles que são mais firmes e seguros que os imbondeiros.
Ontem, ao visitar um blog de um destes amigos (grande, grande amigo), deparei com este post. Comoveu-me saber (e sentir) que aquelas palavras foram moldadas para mim – e isto de juntar palavras e harmonizá-las, dar-lhe corpo, não é tarefa fácil. Para além desta prenda, presenteou-me com uma outra – um cd de música das nossa terra. Tendo gostado das duas, é fácil perceber qual é que me tocou mais. Obrigado Henrique.

Marcas indeléveis (do Império)... 2

Banco de Angola em Malange


"Viagens com ou sem memória" (3)



O Presidente da República mostrou-se surpreendido com os inúmeros sinais que os portugueses deixaram na Indía. Não imaginava ele que a nossa presença por aquelas terras tinha deixado marcas tão indeléveis.

O que a mim me surprende é a sua surpresa. Há uns livrinhos de História que contam tudo.

Antecipando outras viagens do Presidente da República aos novos países da lusofonia e a fim de lhe poupar novas supresas, inauguro hoje uma exposição fotográfica avulsa e ao calhas sob o tema:

Marcas indeléveis do Império (1)

Igreja da missão do Bimbe


"Viagens com ou sem memória" (2):


“Cacimbo a cacimbo, de calema em calema, os nossos velhos ergueram lugares, vilas e cidades onde, antes, só havia mato e capim! Uniram margens, outrora intransponíveis! Abriram picadas, rasgaram caminhos. Uns de ferro, outros de terra batida, mais tarde de alcatrão. Edificaram escolas. Construíram portos. Ensinaram a ler, a escrever, a fazer contas. Substituíram o cazumbir e o feiticeiro, pela sulfamida, o quinino, a penicilina, o enfermeiro e o médico. Numa esteira estendida pelo chão, no quimbo ou na sombra de uma mangueira, quantas vezes com amor, outras por precisão, fizeram mulatos, morenas de Angola, garotas de Ipanema! Que sonetos mais bonitos podiam ter feito? Vejo e oiço os dirigentes deste meu Velho País. Arrepiam-se, como eu, quando em pedras esquecidas pelo tempo e pelos homens, e corroídas pela erosão dos séculos, se decifram tenuemente as Cinco Quinas esculpidas por mãos sem nome e sem rosto. Emocionam-se, como eu, quando ouvem palavras soletradas em português por bocas famintas de gente humilde em lugares longínquos e inóspitos onde, perante tão grande lonjura, se pergunta, mas ali havia gente? Também ali chegámos? Palavras ditas com sotaque em que o artigo definido ou indefinido, admiravelmente, não concorda, quanto ao número com o substantivo que o acompanha. Palavras que têm o sabor das manga, dos coco e das goiaba. Emocionam-se e logo se lembram, como eu, de citar Pessoa: a Língua Portuguesa é a minha Pátria! Mas a nenhum deles ocorre perguntar, como eu tantas vezes me pergunto, com a ironia de quem sabe de antemão a resposta, quem é que construiu essa Pátria sem fronteiras a que chamam, agora, com acerto, Lusofonia? Quem é que lhe desenhou o corpo, tisnou a pele e lhe deu alma? Sem ter consciência disso, eu sei. Mas quem foi? Quem é que teceu esses laços que nem a erosão do tempo, as distâncias e as guerras lograram destruir e que, agora, todos dizem querer preservar e cuidar como se de frágeis flores se tratassem? Quem é que espalhou essas palavra portuguesa, como se fossem sementes, por essas terra longínquas? O vento não foi certamente..., diria um outro poeta, embora, pela grandeza da obra, mais parece ter sido mister da natureza do que dos homens! Quem foi? Quem foi? Quem foi, então!?

Eles, os dirigentes deste meu velho país, sabem tão bem como eu. Mas não ousam dizê-lo. Prisioneiros do que é politicamente correcto, não têm a coragem do poeta de Abril que gritava bem alto: “Há que dizer-se das coisas o somenos que elas são/Se for um copo é um copo/ se for um cão é um cão”.
 
Vá! Não tenham medo da palavra! Foram os colono! Porra! Foram os colonos! Chiça!

Foram os nossos velhos! Os que há muito partiram, os que partiram há pouco, os que – como o meu pai – em breve partirão e os que – como nós – um dia partirão. Mais ninguém! Eles que (sem saber) escreveram tantas páginas da nossa História,  a História (feita hoje) reservar-lhes-á apenas as mais sujas (que as houve)… Tamanha injustiça!
 
Não foi uma obra desinteressada? Tem páginas negras? Gerou injustiças? Correram lágrimas e sangue? Apontem-me obra humana sem mácula, inocente, pura, perfeita!

Isto foi parte do que, há uns anos, escrevi, talvez com excessiva emoção, a propósito da morte de um antigo professor e da morte do meu pai que então se esperava para breve.
Subscrevo: "viagens com ou sem memória" de J.Pacheco Pereira
"Pode-se ir à Índia sem Vasco da Gama? Talvez possa, mas para um português, não se deve. Não digo tanto “sem Vasco da Gama”, mas “sem Goa”, sem a memória da nossa identidade que lá ficou um pouco enterrada e está a cair aos bocados. Mas mesmo que já estivesse toda no chão, enterrada por desprezos diversos, o lugar está lá, as almas estão lá num canto qualquer a assombrar-nos. A história é assim: não se pode ir à Índia com inocência absoluta, nem aliás os indianos nos responderão com inocência. A história pesa. Não é saudosismo, é respeito por nós próprios que fomos feitos por aqueles homens que por lá andaram à espadeirada, à pimenta, na pirataria, brutos, cruéis, gananciosos, vaidosos, crentes, santos, líricos, o que se queira, mas nossos. Vem nos Lusíadas, que tanto patriota cá da casa gosta de bater no peito, para esquecer quando vê um call center deslocalizado."

Cemitério de Pianos: um livro a não perder



Acabei há dias de ler o Cemitério de Pianos. Há livros que leio de um fôlego. Este não. Este saboreei-o, página a página, frase a frase. Tive dificuldades em chegar ao fim. Por duas razões: frequentemente lia e mal acabava de ler, voltava a ler de novo (não para perceber o sentido do texto como me acontece, confesso, com alguns dos nossos consagrados não é preciso dizer quais) mas para sentir de novo o prazer que a leitura daquela passagem, inúmeras passagens me dera. Lia e voltava a ler para me deter na luz que quotidianamente entrava  pelas janelas e iluminava os pontículos suspensos de poeira ou a claridade que se espelhava nos rostos dos personagens sem estes se darem conta. Outras vezes hesitava em avançar com receio de não encontrar imagens tão bonitas como aquelas que acabava de ler. Como esta:
"A minha mulher passa. Não repara na agitação inivisível e luminosa de notas de piano que deixa à sua passagem. Leve, passa com as mangas arregaçadas até aos cotovelos. Sem reparar, leva a claridade da manhã no rosto. Entra no corredor. ..."
ou esta:
"Ela tinha os cabelos apanhados num laço, era uma menina e, no seu rosto, havia qualquer milagre: pureza: que eu não sabia descrever. Os olhos grandes: o céu. Se estivesse suficientemente perto, acredito que poderia ter visto passáros a planarem dentros dos seu olhos, seria um mês da primavera dentro dos seus olhos: infinito. Ela era uma menina frágil e meu olhar pousava com cuidado na pele do seu pescoço, nos ombros sob o vestido de flores que trazia."
A história, adiantou o autor na apresentação do livro, tem dois narradores (?), com o mesmo nome: o avô e o neto de Francisco (Lázaro), carpinteiro e maratonista que morreu em plena maratona nos jogos olímpicos de 1912 em Estocolmo (untara o corpo de sebo para se proteger das câimbras e da fadiga – o que lhe foi fatal) . Desde o ínicio do livro e este é um dos lados interessantes do livro procuramos saber qual das vozes é que fala e em que tempo –  se de um de outro –  é que as coisas acontecem. Mas a dada altura é tal a dificuldade em estabelecer quem é que está a narrar que decidimos entregarmo-nos apenas ao prazer da leitura que, no meu caso, foi muito. Muito.



Aconteceu Taça (Porto 0 - Atlético 1) !!!

Mas por vontade expressa do árbitro (descaradamente) não teria acontecido... cinco minutos de descontos despropositados e um penalty inventado...

Não posso deixar de lembrar (aos amigos comuns) que o Atlético da Tapadinha era o club do coração do Aníbal Fernandes.


Subscrevo:

"A morte de Saddam Hussein" de José Pacheco Pereira in Abrupto. Muito em particular o 3.º parágrafo.













Ano de 2007

Já tinha dado os votos de Bom Ano aos meus familiares e amigos. Faltava aos visitantes deste Blog. (São mais ou menos os mesmos...)

Quand même: Um Bom Ano!